sexta-feira, 6 de setembro de 2013

Vitrines holandesas - J.P. Coutinho

Você, leitor, que é pessoa versada em novas tecnologias, conhece o Google Now?
Eu não conheço. Eu não conhecia. Até ler Claire Cain Miller em prosa dominical para "The New York Times". Instrutivo.
O Google Now é um novo "app" (para usar a linguagem cafona dos ciberfanáticos) que envia informação para o utilizador mesmo antes de nós precisarmos dela.
Conta a autora que, depois da inscrição no Google Now, o bicho deu sinais de vida no celular. Com uma sugestão: era preciso sair 15 minutos mais cedo de casa para chegar no horário ao jantar. Isso porque o trânsito no centro estava uma barbaridade. Como foi possível ao Google Now saber tudo isso?
Sabendo. Cruzando informação. Primeiro, o "app" foi às reservas do OpenTable no Gmail da autora, só para confirmar a hora da reserva no restaurante.
Depois, através da localização do celular, deu uma espreitada no Google Maps, confirmou os endereços (da casa e do restaurante), fez as contas ao trânsito e deu a sua sentença. Era preciso sair 15 minutos mais cedo. O cenário é puro Philip K. Dick. Só na ficção científica o futuro é antecipado no presente de forma a alterar esse mesmo futuro. Existe até um conto de Mr. Dick, "Minority Report", que deu filme tolerável. Mas, como sempre, divago.
Ou, como sempre, talvez não. Porque essa pequena história não horroriza apenas pela forma totalitária como ela condiciona o futuro, transformando cada ser humano numa espécie de marionete da tecnologia.
A história horrorizou Claire Cain Miller pela quantidade de informação que uma empresa é capaz de saber sobre um ser humano. Onde ele está. Onde ele mora. Onde ele vai jantar. E até que rota ele costuma fazer para chegar do ponto A ao ponto B.
Não sei se o Google Now dá uma olhada no cardápio do restaurante e, atendendo ao histórico gastronômico da comensal, vai encomendando o filé no ponto e aquela garrafa de vinho que é aberta em ocasiões especiais.
Porque chegará o dia em que o Google Now saberá por antecipação quais são as nossas ocasiões especiais: lendo torpedos apaixonados ou até medindo, de cada vez que encostamos o ouvido ao celular, o nosso batimento cardíaco enamorado. E saberá tudo isso porque fomos nós a fornecer as informações mais relevantes sobre a nossa existência.
O recente escândalo com a Agência de Segurança Nacional dos Estados Unidos é um caso exemplar. Sim, mil vezes sim: não cabe ao governo americano violar grosseiramente a privacidade de cidadãos e estrangeiros, espiolhando e-mails e contas de Facebook.
Mas, oh Deus, é tão fácil e tão tentador! Antigamente, espionagem era coisa difícil. Perigosa. Demorada. Era preciso vigiar o suspeito --dias, semanas, meses. Conhecer as suas rotinas com precisão de mulher despeitada. Depois, era preciso entrar lá em casa, instalar grampos, sair sem deixar rastro.
E depois vinham novos dias, semanas ou meses em que era preciso escutar com paciência de santo todas as conversas, todos os suspiros, todos os roncos do sujeito.
Hoje, uma distopia como o "1984" de George Orwell seria incompreensível. Não é preciso nenhum aparato totalitário para saber quem somos, o que somos, o que fazemos, onde estamos, do que gostamos, do que não gostamos, com quem vivemos, onde nascemos, onde estudamos, o que estudamos, o que fazemos.
Nós próprios fornecemos essa longa lista de privacidades que fariam as delícias das antigas polícias secretas dos regimes totalitários. Alegremente. Publicamente. Voluntariamente. E cedemos por quê?
O filme é fraco, mas a frase é primorosa: "Vaidade: definitivamente, o meu pecado favorito". Assim falava "O Advogado do Diabo", pela boca diabólica de Al Pacino.
Que o mesmo é dizer: mergulhados na nossa irreprimível condição narcísica, usamos a tecnologia e as redes sociais para montar pequenos altares públicos aos nossos umbigos privados.
E, claro, nessa adoração onanista acabamos por destruir a mais importante conquista da civilização ocidental: esse espaço íntimo onde os olhos de terceiros não entram.
Nada disso desculpa os abusos do poder político? Fato. Mas quem não quer ser tratado como carne para canhão não deve exibir-se nas vitrines holandesas dos bairros vermelhos da internet.

O fascismo do PT contra os médicos - Pondé

O PT está usando uma tática de difamação contra os médicos brasileiros igual à usada pelos nazistas contra os judeus: colando neles a imagem de interesseiros e insensíveis ao sofrimento do povo e, com isso, fazendo com que as pessoas acreditem que a reação dos médicos brasileiros é fruto de reserva de mercado. Os médicos brasileiros viraram os "judeus do PT".
Uma pergunta que não quer calar é por que justamente agora o governo "descobriu" que existem áreas do Brasil que precisam de médicos? Seria porque o governo quer aproveitar a instabilidade das manifestações para criar um bode expiatório? Pura retórica fascista e comunista.
E por que os médicos brasileiros "não querem ir"?
A resposta é outra pergunta: por que o governo do PT não investiu numa medicina no interior do país com sustentação técnica e de pessoal necessária, à semelhança do investimento no poder jurídico (mais barato)?
O PT não está nem aí para quem morre de dor de barriga, só quer ganhar eleição. E, para isso, quer "contrapor" os bons cidadãos médicos comunistas (como a gente do PT) que não querem dinheiro (risadas?) aos médicos brasileiros playboys. Difamação descarada de uma classe inteira.
A população já é desinformada sobre a vida dos médicos, achando que são todos uns milionários, quando a maioria esmagadora trabalha sob forte pressão e desvalorização salarial. A ideia de que médicos ganham muito é uma mentira. A formação é cara, longa, competitiva, incerta, violenta, difícil, estressante, e a oferta de emprego descente está aquém do investimento na formação.
Ganha-se menos do que a profissão exige em termos de responsabilidade prática e do desgaste que a formação implica, para não falar do desgaste do cotidiano. Os médicos são obrigados a ter vários empregos e a trabalhar correndo para poder pagar suas contas e as das suas famílias.
Trabalha-se muito, sob o olhar duro da população. As pessoas pensam que os médicos são os culpados de a saúde ser um lixo.
Assim como os judeus foram o bode expiatório dos nazistas, os médicos brasileiros estão sendo oferecidos como causa do sofrimento da população. Um escândalo.
É um erro achar que "um médico só faz o verão", como se uma "andorinha só fizesse o verão". Um médico não pode curar dor de barriga quando faltam gaze, equipamento, pessoal capacitado da área médica, como enfermeiras, assistentes de enfermagem, assistentes sociais, ambulâncias, estradas, leitos, remédios.
Só o senso comum que nada entende do cotidiano médico pode pensar que a presença de um médico no meio do nada "salva vidas". Isso é coisa de cinema barato.
E tem mais. Além do fato de os médicos cubanos serem mal formados, aliás, como tudo que é cubano, com exceção dos charutos, esses coitados vão pagar o pato pelo vazio técnico e procedimental em que serão jogados. Sem falar no fato de que não vão ganhar salário e estarão fora dos direitos trabalhistas. Tudo isso porque nosso governo é comunista como o de Cuba. Negócios entre "camaradas". Trabalho escravo a céu aberto e na cara de todo mundo.
Quando um paciente morre numa cadeira porque o médico não tem o que fazer com ele (falta tudo a sua volta para realizar o atendimento prático), a família, a mídia e o poder jurídico não vão cobrar do Ministério da Saúde a morte daquele infeliz.
É o médico (Dr. Fulano, Dra. Sicrana) quem paga o pato. Muitas vezes a solidão do médico é enorme, e o governo nunca esteve nem aí para isso. Agora, "arregaça as mangas" e resolve "salvar o povo".
A difamação vai piorar quando a culpa for jogada nos órgãos profissionais da categoria, dizendo que os médicos brasileiros não querem ir para locais difíceis, mas tampouco aceitam que o governo "salvador da pátria" importe seus escravos cubanos para salvar o povo. Mais uma vez, vemos uma medida retórica tomar o lugar de um problema de infraestrutura nunca enfrentado.
Ninguém é contra médicos estrangeiros, mas por que esses cubanos não devem passar pelas provas de validação dos diplomas como quaisquer outros? Porque vivemos sob um governo autoritário e populista.