quarta-feira, 28 de março de 2012

Habemus Papam



Habemus Papam
Nanni Moretti
2011.

O que era para ser uma comédia italiana (escrachada, gritada, cheia de sexo e nudez, como de costume italiano), se tornou para mim um drama em moldes trágicos.
O ator e diretor Nanni Moretti aborda a escolha e ascensão de um papa ao poder de forma cômica sim, mas o toque trágico está presente em quase todas as cenas em que o então eleito papa aparece.
O filme adentra a vida no Vaticano e de seus cardeais. Logo no início do filme já se tem um dilema moral: a câmera caminha por cada um dos cardeais e lê seus pensamentos, que por fim, se unem num uníssono pedido - eu não, Senhor!
A escolha do papa é feita e lê-se nos rostos de cada cardeal o alívio por não ter sido escolhido e a satisfação por ter a quem seguir, a não ser por um deles: o próprio escolhido. O enredo se dá a partir daí, acompanhando a angústia e o fardo que é sustentar as roupas e o peso moral do que é ser o Papa.
Nanni Moretti aparece como o psicanalista contratado para resolver a indecisão do então escolhido papa em seguir a diante. Impossibilitado de tratar assuntos típicos da psicanálise - infância, mãe e desejos reprimidos - o psicanalista se vê de mãos atadas, mesmo ouvindo o choro sofrido do papa numa oração à Deus.
O papa acaba por fugir do Vaticano e se mistura à população de Roma. Como um simples velho local, ele participa da vida ordinária, dorme, come e se locomove como um anônimo, até se deparar com um grupo de teatro que ensaia uma peça do russo Tchecov. Cenas lindas da sequência que segue, onde o papa e um ator declamam parte de A Gaivota.
Moretti é assumidamente ateu e socialista e isso sem dúvida transparece em alguns momentos de sua crítica à  igreja católica. Mas essa crítica não se limita à religião em si, mas também à psicanalise, a nossa religião moderna.
São muitos os dilemas propostos pelo filme, mas o que ficou é exatamente o questionamento sobre o significado em torno da figura papal: um duelo entre o divino e o humano. A impossibilidade de tratamento e resolução dos conflitos do papa pela Igreja ou pelo psicanalista demonstra claramente em que ponto estamos: nem a religião nem a medicina, estamos mesmo perdidos.
E o sentimento ao final do filme, ao acender das luzes do cinema foi exatamente este. Não há saída.

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